Charge de Bruno Mantovani, veja o trabalho dele em http://mantovani.zip.net/
Consegui bravamente acompanhar as duas primeiras corridas da Fórmula 1, ambas ocorridas do outro lado do planeta, o que fez com que as corridas fossem exibidas aqui de madrugada.
Sono vencido, pude presenciar o que muitos já diziam: A F1 virou de cabeça pra baixo, parece até um sonho surrealista para quem assistia até o ano passado e não acompanhou a pré-temporada. Equipes decadentes de uma hora pra outra tomam o lugar das grandes. Williams e Toyota que estavam quase a abandonar o circo de repente começam a correr nas cabeças.
O caso mais surpreendente é o da Honda. A montadora se retirou da F1 por conta da crise econômica e coube ao chefe de equipe Ross Brawn "realinhar" os carros da equipe no grid, agora dando seu nome para a agora Brawn GP. E assim que começaram os testes os carros ainda brancos deixaram os outros comendo poeira. O resultado é que um de seus pilotos, Jenson Button, ganhou as duas corridas realizadas até o momento.
Seu companheiro de equipe é um velho conhecido: Rubens Barrichello, e é dele que quero falar agora. Parafraseando o presidente Lula, nunca na história deste país um desportista foi tão injustiçado durante sua carreira como ele, e de uns tempos pra cá isso tem ficado tão evidente que já está se tornando um mantra falar assim de Rubinho.
Ele é azarado? Eu posso dizer que sim, e muito, mas não por uma suposta frequência de maus resultados, mas porque considero que ele foi o piloto certo na hora errada. Em suma: o azar dele foi ser o melhor piloto brasileiro correndo na F1 na ocasião da morte de Ayrton Senna, e como passamos anos acostumados com brasileiros ganhando corridas e disputando títulos (no caso Senna e Piquet - o pai) botaram ele pra fazer esse papel para alimentar a esperança da nação. Só esqueceram de dar a ele um carro tão potente quanto a McLaren que Senna usou para ser campeão, ou a Brabham que Piquet pai usou para a mesma coisa, e deixaram ele correndo numa Jordan com um dos piores motores do circo. Mesmo assim Rubinho tirou leite de pedra com destaque para a pole do GP da Bélgica daquele ano.
Depois disso foram anos de atuações discretas com carros mais fracos ainda, mas mesmo assim o brasileiro (sempre ele) achava que Rubinho ia destruir nas corridas. Como isso não ocorreu começaram a achincalhar o coitado chamando-o por exemplo de Rubinho Pé-de-chinelo.
Até que deram a ele o melhor carro que havia disponível - o da Ferrari. Agora vai não é mesmo? Não, não foi, pois deram um carro igualzinho para Michael Schumacher, e com ele o alemão destruiu quase todos os recordes possíveis e inimagináveis, não deixando nada nem pra Rubinho, nem pra seu ninguém.
Juntando tudo isso a Fórmula 1 viveu no Brasil um período semelhante ao que o Futebol viveu entre o tri e o tetra, permitindo até comparar Rubinho a um ídolo do futebol: Zico, que foi um craque indiscutível mas que nunca trouxe um tíulo mundial, o que marcou sua carreira tanto quanto o pênalti perdido contra a França em 1986.
Mas agora o vento parece finalmente soprar a favor do piloto, agora na Brawn GP, uma equipe com um carro inacreditavelmente forte pelo fato de ser uma equipe novata originada de outra que estava em estado falimentar. Até o momento nas duas últimas corridas o desempenho de Rubinho foi bem satisfatório e conseguiu resultados expressivos mesmo com os contratempos que surgiram como o difusor que quebraram na Austrália e o dilúvio na Malásia.
Poucos sabem mas Rubens Barrichello, o homem que mais correu GPs na história (foram 269, e contando) pode ser considerado o terceiro maior piloto brasileiro da história da Fórmula 1 mesmo sem nunca tendo sido campeão mundial, mas por possuir outras estatísitcas expressivas que superam o desempenho de Emerson Fittipaldi e, em alguns casos, até mesmo o de Nelson Piquet.
Por isso estou torcendo para que Rubens aproveite a oportunidade que lhe deram para mostrar todo o seu potencial já que agora ele não tem a mesma pressão que cercou toda sua carreira. Não vai demorar para que sua 10ª vitória na carreira venha se ele vier a confirmar nas corridas o mesmo desempenho da pré-temporada.
Por isso afirmo, o Pé-de chinelo renasceu. É a fênix de havaianas.
Eu estarei assistindo na expectiativa. A F1 não é a mesma da época de Senna como tanto aguardávamos, mas está tão interessante de acompanhar quanto.
***
Atualização: Em seu ano de estréia (1993) Rubens Barrichello largou em 12º no grid do GP da Europa daquele ano em Donington Park. A aula que Ayrton Senna deu na ocasião ofuscou o salto que Rubinho deu até a 4ª posição com uma Jordan-Hart, e na primeira volta, assim como Senna. Assim que passou Alain Prost e assumiu a 3ª posição um problema de injeção parou o carro a seis voltas do final.
Justiça seria feita quinze anos depois (2008) na mesma Inglaterra (mas agora em Silverstone). Desta vez largando em 16º, aos poucos ele foi galgando posições até terminar a prova em 3º, com um carro fraco e debaixo de chuva assim como naquele domingo em Donington. E assim quebrou um jejum de três anos sem subir ao pódio.
Outro capítulo marcante da carreira de Senna na qual Barrichello também foi personagem despercebido foi no fatídico GP de San Marino de 1994. No treino de sexta-feira, seu carro decolou na zebra da variante bassa e se esborrachou na proteção de pneus. Por conta do acidente ficou de fora desta corrida (que depois matou 2 pilotos e que por pouco Barrichello não entra na conta) e da seguinte em Mônaco. Mal sabia ele que esta corrida viraria um divisor de águas em sua carreira.
Um relato muito bem escrito do episódio se encontra no blog Cadernos do Automobilismo, de Daniel Médici.
Créditos da foto: Blog Voando Baixo.
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