domingo, 13 de setembro de 2009

O status do sofrimento

  • Preste atenção nas conversas de botequim. Melhor, preste atenção em qualquer conversa por aí, principalmente quando dois conhecidos se encontram. Já perceberam como é a tônica da conversa? Nossa! tô me matando de trabalhar; vou fazer concurso, tô estudando até de madrugada; a pós tem me tomado um tempão, etc. etc.
  • Quando você está andando de ônibus ou de metrô fica aquele debate pra ver quem é mais velho, quem tem mais doença, pra ver quem vai sentado ou não, quem precisa de mais espaço ou não, quem precisa de mais conforto ou não e por aí vai.
  • Aqueles que chegam dizendo que saíram no fim de semana, que viajaram, etc. é logo taxado de folgado, vida boa, marajá...
Estes são pequenos exemplos de como o sofrimento é mais valorizado do que o bem estar no meio social. Poderia incluir mais exemplos mas muitos deles se encaixam nos que citei acima com as devidas adaptações. Sofrer na vida é bem visto. Nos sentimos bem quando os outros se surpreendem com nossa situação, ficam com pena da gente, se solidarizam conosco.

No primeiro exemplo mesmo o importante é saber quem é mais atarefado - quem trabalha mais, quem estuda mais - e não pode ser nada muito fácil não, não pode ser algo que pareça que você fica de pernas pro ar o dia todo. O trabalho que a gente quer mostrar pra impressionar os outros tem que ser em esquema de início de revolução industrial: 12 horas diárias mais horas extras, patrão carrasco e explorador, colegas de trabalho que só fazem te dar mais trabalho, salário mixuruca, etc, etc. Ninguém trabalha no lugar que gosta, sempre está correndo atrás desse lugar que gosta.

Esse lugar geralmente é o tão sonhado emprego público, mas quem admite que passou em concurso pra depois ser taxado de marajá? Nada disso, o que faz a pessoa ficar bem na fita é ser concurseiro profissional. De dia, trabalhar (e ficar o tempo todo falando em provas, editais, apostilas...), de noite ficar no cursinho até às onde da noite pra chegar em casa e se enfurnar nos livros até de manhã, quando o ciclo se reinicia...

Mas ainda tem a faculdade. Sim, prova toda semana, às vezes revezando com seminários, provas, trabalhos. Ou então está fazendo pós-graduação, mestrado, doutorado ou coisa que o valha: uma monografia ou uma tese a redigir e que tem tirado suas noites de sono.

Agora para locomover-se para todos estes lugares você também não pode ter mordomias, ora essa, tá pensando o quê? De carro? Tem que dizer que sofre pra estacionar, que para na terra. De ônibus? Lotado, que roda por toda a cidade, que anda muito e para longe do destino.

Aliás, no transpore público é quando mais reclamamos da saúde, ou da idade. Agora passou a ser uma coisa boa ser idoso ou grávida, assim tem prioridade pra ir sentado. Aliás, é bom para várias coisas, principalmente para ter atendimento preferencial, passar na frente da fila e outras coisas mais. Se você não se encaixa nesse perfil, basta dizer q tem algum problema de saúde e está resolvido, todos se apiedam de você e te dão todo o privilégio possível. Só não pode se gabar por isso.

Tudo isso pode ser explicado da lógica de que quando alguém está melhor do que nós em algum aspecto sentimos uma ponta de inveja, e se estamos melhor a pessoa sente inveja. Como fica meio chato parecer bem quando todos estão mal vivemos a reclamar de tudo, de ficar insatisfeito com tudo.

O problema é que interiorizamos isso e essa insatisfação acaba por consumir a gente a ponto de querermos realmente virar burros de carga, já pensando no que os outros vão pensar se estivermos "bem de vida", então nada fica satisfatório mesmo. Sem falar quando este sentimento se transforma em inferioridade, quando o outro sempre está melhor do que a gente - e a velha máxima de que o jardim do vizinho está sempre mais verde do que o nosso passa prevalecer.

Bem, existem mil explicações para tais fenômenos, principalmente culturais, mas fica a lição para que não nos matemos com mil compromissos, abra sua agenda para atividades prazerozas e de lazer sem vergonha do que os outros vão achar. Você fica perto do bem estar e longe do stress. Afinal de que adianta sofrer tanto se sofrer é uma coisa ruim, por mais que os outros achem bom?

Um comentário:

  1. Tudo culpa de nossa cultura Cristã, onde o símbolo máximo é um instrumento de tortura e punição...
    Mas enfim.... PARABÉNS POR SEU BLOG. CARA CURTI MUITOOOOOOOOOOOOOOOOOO
    Desenhos 80's são demais.. spiral zone, silverhawks e thundercats.... sniff sniff.. nostalgia..

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