segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

O dia em que renascemos



Por Samarone Lima (publicado originalmente no Blog do Santinha)

Amigos corais, sem embromação, sem firulas ou detalhismos: Ontem, dia 18 de janeiro de 2009, o Santa Cruz Futebol Clube foi refundado. Um senhor de 95 anos voltou a ser menino.

Preciso recorrer à pequena filha de Inácio, Julia, para explicar tantos sentimentos. Ontem, Julia era a menina mais sorridente de Pernambuco, a mais bela das criaturas. Acompanhei, no final da manhã, a cerimônia oficial de preparação para entrar em campo. Calção do Santa, meia do Santa, camisa do Santa.

Júlia, de apenas seis anos, iria entrar em campo com nosso time.

Ah, meus amigos, não há lirismo maior que esse, não há imagem que retrate tão bem o que vivemos ontem. Uma singela menina com sorriso meigo, protegia nossos atletas de qualquer maldade. Da sociais, seu pai, o velho Inácio, jornalista que já escreveu centenas de matérias para jornais e revistas, um homem que agüenta apertos sem choramingos, não aguentou. Chorou de emoção. O choro do pai que vê a filha com apenas seis anos, inaugurando o gramado do novo clube.

Ontem, até o mais frio dos tricolores sofria de hipersensibilidade, de fantasia, lirismo. A Zona Norte da cidade estava repleta de poetas.

Nas arquibancadas, após a entrada do time, olhei para a torcida. Um homem, de seus 65 anos, chorava de soluçar. Ao lado, possivelmente sua esposa, era o pranto em estado puro. Impossível não sentir uma fisgada no coração.

Ontem, como disse o glorioso Laércio Portela, a torcida do Santa não encontrou o time, mas encontrou a si própria.

Não, amigos, não falarei do jogo. Ganhamos os três pontos. Deixemos aos especialistas as análises, os comentários, as notas. Prefiro falar do espírito que envolve o Santa Cruz e sua Torcida.

Ontem, pela primeira vez, vi um clube respirar paixão, mas aliada ao profissionalismo.

Vi nosso Diego Galdino, junto à entrada, fardado, orientando a torcida. Estava lá, como voluntário, ao lado de um pequeno exército brancaleônico. Todos resolveram arregaçar as mãos e ajudar no que fosse possível. Estavam lá Chiló, Dani, Gerrá, e tantos outros que agora fazem dessa história.

Olhei tudo, anotei tudo. Como sempre, nesses momentos de extrema emoção, de participação do povo, me afasto do turbilhão e passo a observar como se não estivesse lá.

Estou de pé, defronte ao Arruda, são 15h. Os ônibus passam apinhados. Uma multidão vai chegando à sede do nosso clube. Chegam loucos de saudade. Levam bandeiras, bonés, levam filhos nos ombros, mas levam, acima de tudo, esperança. Nosso clube, que passou por tantas humilhações, ao longo dos últimos anos, vai renascendo.

Bebo uma cerveja numa pequena barraca. Passam os amigos, que acenam. Vejo um tricolor discutindo com sua esposa. Daqui a pouco, ela chora. Não sei o motivo da briga, sei que ele diz algumas palavras, depois vai para seu lugar, que é o Arruda. Não, minha querida, isso não é hora de brigar, discutir, reclamar, pedir nada. É hora de embalar a paixão e chegar ao único lugar possível neste momento -as arquibancadas.

Súbito, escuto um urro. É a massa coral, dento do clube. Cantam o hino, invocam o “junta mais essa vitória”.

É um domingo de metáforas. A massa está dentro do clube.

Olho para os ônibus. Bomba do Hemetério; Santa Casa/Encruzilhada; Água Fria; João de Barros; Beberibe/Av. Norte; Alto do Capitão; Aguazinha/Joana Bezerra.

E súbito, amigos, passa o Alto da Bondade.

Só mesmo diante do Arruda, pode passar um Alto da Bondade.

Entro no estádio. Está lá, a graminha verde da esperança. O estádio pintado, bonito, a torcida em estado de graça. Segundo os jornais, éramos 30 mil torcedores.

Trata-se de um engano. Ontem, no Arruda, estavam presentes todos os tricolores mortos, vivos, e os que estão por nascer.

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